“A cidade contemporânea escapa às definições tradicionais, mas queremos atá-la ao pedestal de um patrimônio. Na realidade, o exercício que experimentamos é um tanto vão, o passado se esquiva àquilo que lhe pede o presente.”[1]
(Jacques Le Goff- Por amor às cidades –fl.143)
Atual Rua do Rosário Acervo Fontana |
Ouro Preto é uma cidade que como todas as outras, precisa da manutenção em seus equipamentos urbanos, devido seu desgaste ao longo do tempo. Devido as suas características específicas, este tratamento deve passar por critérios e cuidados concernentes as suas características. Seu processo de construção e reconstrução ao longo de mais de três séculos faz com que exista uma série de complicadores. Para que estes trabalhos sejam realizados de maneira mais segura, respeitando as técnicas de restauro, é necessário se ater a antigas técnicas e aos materiais usados na construção.
Nos últimos dias a cidade vem passando por obras de estabilização e recomposição do calçamento na Rua do Rosário, antiga São José, devido à desestabilização e abatimento do piso. Nesta postagem apresentamos alguns documentos referentes à obra de construção deste muro de amparo e do calçamento.
O arquivo possui um rico dossiê dos trabalhos contratados e realizados no ano de 1892-1894, ele é composto de tabelas de medição, relatórios, pareceres e requerimentos sobre a obra, seus problemas, complexidades, tipos de material e mão de obra empregada.
O ofício de 24 de dezembro de 1892, do engenho Modesto Bello, enviado ao Presidente e agente Executivo da CMOP, Diogo Luiz de Almeida Pereira de Vasconcelos, são relatados problemas estruturais no paredão de amparo da referida rua, que estariam trazendo riscos aos terrenos vizinhos:
“O Paredão existente, pela fenda que manifestou-se na rua entre as casas do Coronel Francfort e Capitão Olympio Ferrer, cedeu mais em parte onde o terreno, fortemente escarpado, não tem amparo algum até os fundos das casa da rua da Glória...”[2]
No Relatório dos Engenheiros Modesto de Faria Belo e Joaquim Machado de Mello, contratados pelo Presidente e Agente Executiva da CMOP Randolpho Bretas e pelo empreiteiro Capitão Antônio Bento de Souza são apresentados: o projeto e os trabalhos de fiscalização da execução correta da obra para a aprovação das contas e autorização do pagamento. Os engenheiros informam a complexidade do trabalho executado, devido a fragilidade do terreno. São feitas considerações importantes sobre a técnica a ser empregada para melhor segurança, como altura da sapata, alicerces e paredes.
“Quanto a altura da parede na diversas seções acima da sapata, quando deixei a direção das obras, regulava de 4,60m à 5,00m, parecendo já regula com o nível da rua; mas como tinha que ser feito depois o respaldo geral e harmonia com o passeio do lado oposto...”[3]
“Quanto a solidez da obra cumpre-me ponderar o seguinte: No lançamento dos alicerces, na parte por mim fiscalizada houve todo o cuidado em chegar a caixa até onde o terreno apresenta o moledo(sic) com terras resistência...”[4]
Os quadros de medição da obra apresentam como se deu a condução dos trabalhos item por item: bases dos alicerces, escavações, escoramentos, corpo da parede e pilares.
No dia 8 de dezembro de 1893 a Comissão de Obras Públicas enviou um parecer sobre os trabalhos, assinado pelo Vereador da Câmara e engenheiro Bruno Von Sperling. No documento o vereador faz o detalhamento dos serviços executados com as medições dando parecer favorável sobre a boa execução dos trabalhos.
“O aterro e o calçamento a paralelepípedo tem as dimensões exigidas no orçamento, bem assim como o capeamento das cortinas. As obras foram executadas com segurança”[5].
Até o início da década de 30 do século XX, a responsabilidade pela contratação, execução e fiscalização das obras públicas era feita pela Câmara Municipal através do Agente Executivo, que no caso de Ouro Preto, também exercia o cargo de Presidente da Câmara. Nos documentos apresentados é possível identificar as ações para o controle da execução destes serviços, cabendo salientar que havia uma preocupação da CMOP em escolher como membros de suas comissões vereadores com conhecimento técnico das grandes áreas de sua responsabilidade. No caso da Comissão de Obras Públicas, tentava-se a medida do possível ter na comissão um vereador com curso de engenharia.
[1] LE GOFF,Jacques, 1924 – Por Amor às cidades: conversações com Jean Lebrun; tradução Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes. – São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. –(Prisma)
[2] Ofício do Engenheiro Modesto Bello enviado ao Presidente da CMOP Diogo de Vasconcelos. Dossiê obras da Rua São José-24/12/1892.
[3]Relatório do Engenheiro Modesto de Faria Belo fl.4 . Dossiê obras Públicas.
[4]Relatório do Engenheiro Modesto de Faria Belo fl.7 . Dossiê obras Públicas.
[5] Parecer da Comissão de Obras Públicas da CMOP.
Postagem e Revisão: Helenice Oliveira (Graduanda do curso de História) e Polyana Oliveira